
O Que é Literatura Barroca?: Conheça o Marco Literário do Brasil Colonial
O que é literatura barroca? Conheça o Barroco brasileiro (1601-1767): movimento literário e artístico do período colonial, marcado por contrastes, fé e obras fascinantes. Descubra quais foram as suas principais características, autores e obras que marcaram nossa história cultural.
ARTIGOSEDUCACIONALMOVIMENTOS LITERÁRIOS BRASILEIROS
Sebastião Victor Diniz
4/10/20257 min read



O Barroco brasileiro representa um dos períodos mais fascinantes e complexos da história literária e artística nacional. Surgido no final do século XVII e estendendo-se até meados do século XVIII, esse movimento artístico-literário floresceu durante o período colonial, deixando um legado inestimável na cultura brasileira. Caracterizado por sua estética rebuscada, pelo conflito entre o sagrado e o profano, e por uma profunda expressão dos contrastes humanos, o Barroco brasileiro refletiu as tensões de uma sociedade colonial em formação, influenciada tanto pelos valores europeus quanto pelas particularidades do Novo Mundo.
Contexto Histórico do Barroco no Brasil
O movimento barroco chegou ao Brasil durante o século XVII, em pleno período colonial, sendo também conhecido como "seiscentismo" por sua forte presença durante os anos 1600. Nesse momento histórico, a economia brasileira estava fundamentada na monocultura da cana-de-açúcar desenvolvida em extensos latifúndios, através do sistema de plantation que utilizava mão de obra escrava.
As principais atividades econômicas e culturais concentravam-se no litoral nordestino, com Salvador e Recife despontando como os maiores centros urbanos e comerciais do período, representando também os polos de poder político da colônia. A transferência posterior da capital de Salvador para o Rio de Janeiro contribuiu para um considerável aumento populacional no país.
O contexto internacional também exerceu forte influência sobre o desenvolvimento do Barroco brasileiro. A consolidação da União Ibérica, que uniu os reinos de Portugal e Espanha, coincidiu com esse período artístico. Além disso, o movimento foi contemporâneo à Reforma Protestante e à Contrarreforma Católica, eventos que moldaram profundamente as expressões artísticas da época.
Com a decadência da exportação de açúcar nordestino, iniciou-se o chamado "ciclo do ouro", deslocando o eixo econômico para Minas Gerais, onde foram descobertas importantes jazidas. Foi nesse cenário de prosperidade econômica que a arte barroca mineira floresceu, com nomes como Aleijadinho na escultura e arquitetura, e Mestre Ataíde na pintura.
O Papel da Igreja e da Companhia de Jesus
A presença da Igreja Católica e, especialmente, da Companhia de Jesus foi determinante para o desenvolvimento do Barroco no Brasil. Os jesuítas, empenhados na evangelização dos povos indígenas, trouxeram consigo não apenas a fé católica, mas também uma estética artística que serviria aos propósitos de propagação da fé.
Nesse contexto, destacou-se o padre jesuíta Antônio Vieira, que se tornou um dos grandes expoentes da prosa barroca brasileira, com seus sermões repletos de figuras de linguagem e retórica persuasiva. Os textos de Vieira exemplificam perfeitamente a função catequética e propagandística que a arte barroca assumiu a serviço da Contrarreforma.
Características do Barroco Literário Brasileiro
O Barroco brasileiro, que compreendeu os anos de 1601 a 1767, configurou-se como a segunda escola literária do país e apresentou características singulares que refletiam tanto o contexto europeu quanto as particularidades coloniais. Entre suas principais características, podemos destacar:
Dualismo
O dualismo barroco manifesta-se na constante tensão entre elementos opostos, refletindo a crise de valores e a dúvida existencial do homem do século XVII. Em uma época em que a autoridade da Igreja era questionada pelo surgimento da ciência moderna, os textos barrocos expressam a angústia de um ser dividido entre:
O sagrado e o profano
O corpo e a alma
O antropocentrismo (homem como centro do universo) e o teocentrismo (Deus como centro do universo)
Essa dualidade aparece claramente na poesia de Gregório de Matos, como podemos observar no fragmento citado de "E isto é o amor?", onde o poeta inicia descrevendo o amor com romantismo para, em seguida, desiludir-se completamente com o sentimento.
Cultismo e Conceptismo
O cultismo, conhecido como o jogo de palavras, representa um dos elementos mais distintivos da estética barroca. Através de uma linguagem culta, rebuscada e repleta de detalhes, os autores barrocos valorizavam a forma textual, empregando um vocabulário sofisticado e uma variedade de figuras de linguagem para tornar seus textos mais expressivos e elaborados.
Já o conceptismo caracteriza-se pelo jogo de ideias, manifestando-se através de argumentos engenhosos e raciocínios complexos. Os autores utilizavam uma série de recursos retóricos para convencer o leitor, explorando paradoxos e silogismos que evidenciavam sua erudição e domínio da linguagem.
Outras Características Essenciais
Além dos aspectos já mencionados, o Barroco brasileiro apresentou:
Linguagem dramática, que expressa conflitos internos e externos
Racionalismo, refletindo a valorização crescente do pensamento científico
Exagero e rebuscamento nas descrições e construções textuais
Uso abundante de figuras de linguagem, especialmente metáforas, antíteses e hipérboles
Constante jogo de contrastes, materializado no uso frequente de antíteses e paradoxos
Valorização extrema dos detalhes, criando textos visualmente impactantes
Essas características evidenciam um movimento artístico complexo, que buscava expressar as contradições de uma época marcada por transformações profundas no pensamento ocidental e na realidade colonial brasileira.
Principais Autores e Obras do Barroco Brasileiro
O Barroco literário no Brasil contou com importantes nomes que contribuíram significativamente para a formação de nossa identidade cultural através de suas obras. Vejamos os principais representantes:
Bento Teixeira (1561-1618)


Nascido em Porto, Portugal, Bento Teixeira é considerado o inaugurador do movimento barroco literário no Brasil com sua obra "Prosopopeia", publicada em 1601. Este poema épico, composto por 94 estrofes, exalta a figura de Jorge de Albuquerque Coelho, terceiro donatário da capitania de Pernambuco. Ao mesclar elementos da mitologia greco-romana com a realidade colonial, Teixeira criou uma obra que, embora ainda muito influenciada pelos modelos europeus, já apresentava características que marcariam o Barroco brasileiro.
Gregório de Matos (1633-1696)


Nascido em Salvador, Gregório de Matos Guerra é considerado o maior poeta barroco brasileiro e foi apelidado de "Boca do Inferno" devido a suas críticas mordazes à sociedade colonial1. Sua obra multifacetada pode ser dividida em três vertentes principais:
Poesia sacra, em que expressa sua devoção religiosa e angústia espiritual
Poesia lírica, dedicada principalmente a temas amorosos
Poesia satírica, na qual critica ferozmente a corrupção e os costumes da sociedade colonial
A produção poética de Gregório de Matos circulou principalmente em manuscritos, sendo compilada e publicada postumamente. Em seus versos, encontramos a perfeita expressão do dualismo barroco, oscilando entre o pecado e a virtude, o sagrado e o profano, em uma constante tensão existencial.
Padre Antônio Vieira (1608-1697)


Embora nascido em Lisboa, o padre Antônio Vieira passou grande parte de sua vida no Brasil, onde desenvolveu intensa atividade missionária junto aos indígenas. Como orador sacro, Vieira produziu sermões que são considerados obras-primas da prosa barroca em língua portuguesa.
Seus textos caracterizam-se pelo conceptismo, apresentando argumentações engenhosas e uma retórica persuasiva a serviço da fé católica. Entre seus sermões mais célebres estão o "Sermão da Sexagésima" e o "Sermão pelo Bom Sucesso das Armas de Portugal contra as de Holanda".
Além de sua dimensão religiosa, a obra de Vieira possui também um importante aspecto político e social, defendendo causas como a liberdade dos indígenas e criticando aspectos da colonização portuguesa.
O Fim do Barroco e sua Transição para Outros Movimentos
O movimento barroco começou a perder força no Brasil por volta de 1767, quando novas tendências estéticas começaram a surgir. A transição do Barroco para o Arcadismo representou uma mudança significativa na sensibilidade artística brasileira, abandonando o rebuscamento e a complexidade barroca em favor de uma estética mais simples e direta, inspirada nos ideais clássicos.
Essa transição acompanhou mudanças políticas e sociais importantes no contexto colonial, como a expulsão dos jesuítas pelo Marquês de Pombal e a crescente influência do Iluminismo europeu. No entanto, é importante ressaltar que o legado do Barroco brasileiro continuou a influenciar gerações posteriores de artistas e escritores, constituindo-se como uma referência fundamental para a compreensão da formação da identidade cultural brasileira.
Conclusão


O Barroco brasileiro representa muito mais que um simples período artístico-literário em nossa história cultural. Como movimento que se desenvolveu durante os primeiros séculos de nossa formação como nação, o Barroco reflete as contradições, as angústias e as esperanças de uma sociedade colonial em processo de constituição.
A riqueza estética, a complexidade filosófica e a profundidade existencial das obras barrocas brasileiras continuam a fascinar estudiosos e apreciadores da arte, demonstrando a vitalidade de um estilo que, embora originário da Europa, encontrou no Brasil um terreno fértil para desenvolver características únicas e originais. Do cultismo de Bento Teixeira ao conceptismo de Vieira, da sátira mordaz de Gregório de Matos às esculturas expressivas de Aleijadinho, o Barroco brasileiro nos legou um patrimônio cultural inestimável, que permanece como testemunho eloquente de nossa história e de nossa identidade.


Escrito por: Sebastião Victor Diniz
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